O Brasil vive um drama político que mobiliza sua população, os três poderes e suas instituições. A presidente Dilma Rousseff enfrenta atualmente um pedido de impeachment que é apontado por aliados como arma de uma tentativa de golpe, que remonta à quebra institucional de 1964, e por adversários como um fato que reforça a solidez das instituições democráticas do país.

O Nexo ouviu 17 intelectuais e líderes de movimentos para saber suas visões quanto ao atual estado da democracia brasileira.

Ouça as opiniões#

Argelina Figueiredo

Cientista política e professora no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro

“A crise política vai demorar, a reconstituição econômica também, mas não vejo perigo para a democracia apesar de achar que as instituições estão sob ataque por alguns grupos de algumas pessoas”

Eu vejo a atual conjuntura como uma séria crise política. Mas não acho que tenhamos uma crise institucional. A oposição não aceitou a derrota nas eleições de 2014, nós temos visto políticos individuais usando mecanismos institucionais em proveito próprio ou para obtenção de objetivos políticos. Esses grupos têm fortes aliados na elite econômica e na mídia, esses grupos são fortes e não têm demonstrado muito apreço pelo jogo democrático. Mas apesar disso eu acho que as instituições até agora têm sido preservadas e eles têm encontrado uma forte resistência à sua atuação antidemocrática. É lógico que essa crise política vai ter efeito político e pode ter efeitos e mudanças nas instituições, mas eu não vejo uma ameaça à democracia no momento. Mas a radicalização é realmente perigosa e acho que algumas soluções podem não ser democráticas. Eu acho que numa perspectiva futura a gente vai ter uma mudança de... mudança no sistema... não no sistema partidário, que não vai ter, no alinhamento ou realinhamento partidário acho que vamos ter algumas mudanças, mas é óbvio que vai depender um pouco do que vem pela frente e de qual vai ser o resultado. Eu acho que é uma crise... a crise política vai demorar, a reconstituição econômica também, mas não vejo perigo para a democracia apesar de achar que as instituições estão sob ataque por alguns grupos de algumas pessoas até.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Daniel Aarão Reis

Professor titular de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense

“A polarização atual em relação ao impeachment a favor ou contra ela está escondendo algo que é muito mais profundo e mais importante que é o seguinte: quais os rumos que se quer dar para a democracia brasileira?”

A democracia brasileira vive hoje uma crise evidentemente bastante profunda e ela não é apenas política, é econômica também. E ela é mais do que isso: é ética e moral que atinge todo o sistema político. Eu penso que a polarização atual em relação ao impeachment a favor ou contra ela está escondendo algo que é muito mais profundo e mais importante que é o seguinte: quais os rumos que se quer dar para a democracia brasileira? As políticas, implementadas pelos dois governos Lula, de conciliação de interesses e que se viabilizaram num contexto de prosperidade possibilitando um jogo de ganha-ganha, essas políticas já no primeiro governo da Dilma começaram a fazer água. E revelaram-se inteiramente insuscetíveis de sustentação. Elas precisam ser mudadas. É preciso que o país defina políticas que contribuam para superar a crise econômica e aí vem uma questão essencial: quem vai pagar a fatura da superação da crise econômica? As classes trabalhadoras, como quase sempre? Ou as elites políticas e econômicas dominantes? Essa discussão está em falta no momento. A Dilma continuar ou não. O Temer assumir ou não. São questões secundárias em relação ao que há de essencial: que políticas vão ser adotadas para superar a crise? Essa é uma discussão essencial e infelizmente essa discussão não está aparecendo.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Eduardo Marques

Professor do departamento de Ciência Política na USP e vice-diretor do Centro de Estudos da Metrópole

“Em termos causais, a crise se origina acho que no fato de que tem grupos políticos derrotados em 2014 que não aceitaram a derrota e começaram a mobilizar estratégias institucionais para tentar desestabilizar o governo.”

Por um lado, uma dimensão positiva da crise é o fato de que as instituições de controle e punição estão funcionando como nunca funcionaram na história da política brasileira. Quem acompanha nossa política sabe que corrupção, associação entre empreiteiras e empresários e classe política no financiamento de eleições acontecem há décadas, nunca foram punidos. Essa dimensão então só pode ser festejada, e isso só pode se esperar que isso continue a acontecer independente do desfecho da crise atual. Em termos causais, a crise se origina acho que no fato de quem tem grupos políticos derrotados em 2014 que não aceitaram a derrota e começaram a mobilizar estratégias institucionais para tentar desestabilizar o governo. O governo foi incapaz de reorganizar a economia e sua base de apoio e gradativamente grupos políticos e partidos que orbitavam o governo foram se afastando dele criando uma situação de isolamento que é bem difícil de reverter. Uma dimensão mais de fundo diz respeito ao funcionamento do presidencialismo de coalizão brasileiro. Porque se essas instituições de controle e punição continuarem funcionando da forma como estão funcionando agora, e isso é positivo, o principal mecanismo de formação das maiorias legislativas, da construção de apoio do governo no Congresso vai ter custos crescentes no futuro próximo criando dificuldades institucionais para o funcionamento da política propriamente. Os atores atuais estão aplicando o mesmo mecanismo. A presidente Dilma tenta buscar apoio e sobreviver através da mobilização desse mecanismo; e a oposição e o vice-presidente tentam produzir o impeachment por esse mesmo mecanismo atualmente.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Ermínia Maricato

Arquiteta e urbanista, professora titular da FAU-USP

“O que eu vejo é uma acomodação das forças de esquerda que chegaram ao governo federal. Péssimas alianças foram feitas e, eu acho que, fizeram com que a gente regredisse.”

Eu sou muito otimista a médio e longo prazo sobre o desenvolvimento, a evolução, o crescimento e o alargamento da democracia brasileira. Eu não sou otimista a curto prazo. O que eu vejo é que houve uma acomodação das forças de esquerda que chegaram ao governo federal e que, enfim, levou, essa acomodação ligada a alianças que foram feitas, péssimas alianças, eu acho que fizeram com que a gente regredisse. Eu vejo minha área, política urbana, nos anos 80 e 90 política urbana no Brasil era muito avançada, ela estava se transformando e avançando e depois ela sofreu um recuo principalmente sob o domínio do capital imobiliário e dos automóveis. Mas eu acho que a médio prazo a base da sociedade brasileira, especialmente os negros vão cobrar um espaço de maior participação e um espaço democrático efetivo.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Fernando Holiday

Coordenador no Movimento Brasil Livre

“Com o processo de impeachment e com as investigações da Operação Lava Jato nossa democracia é aos poucos recuperada com a população voltando às ruas e se demonstrando totalmente contrária a essas tendências que só fizeram mal à nossa República, à história do nosso país.”

O que a gente tem visto nos últimos meses e anos é que a democracia sofreu um grave atentado principalmente nos últimos 13 anos de governo do PT com um governo de tendências totalitárias que constituiu, que formou os dois maiores escândalos de corrupção na história do nosso país: o mensalão e o petrolão. Com um único objetivo: que era comprar votos do poder legislativo para que suas propostas viessem a ser aprovadas. Uma verdadeira compra da democracia em nome de um projeto criminoso e totalitário de poder. E essa democracia foi sendo ferida ao longo desses anos até que chegamos aqui no ponto máximo dessa crise e agora finalmente com o processo de impeachment e com as investigações da Operação Lava Jato nossa democracia é aos poucos recuperada com a população voltando às ruas e se demonstrando totalmente contrária a essas tendências que só fizeram mal à nossa República, à história do nosso país. E eu tenho certeza que daqui para frente quando essas ruínas forem deixadas para trás e o Brasil ressurgir das cinzas, a nossa democracia sairá mais fortalecida e mais atenta para que outros projetos imundos de poder como esse não voltem a tomar a nossa República e a nossa democracia.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Filipe Campante

Economista e professor de políticas públicas na Harvard Kennedy School

“Por mais que as pessoas discordem veementemente sobre a legitimidade do processo de impeachment, ninguém está falando de quartelada ou de tanque na rua. Isso é um avanço”

Acho que a democracia está passando por um momento de teste, teste de estresse. Obviamente uma crise política dessa magnitude num contexto de uma crise econômica bastante forte coloca estresse sobre o sistema político. Mas se a gente olhar de um ponto de vista mais a longo prazo acho que de certa forma o resultado tem sido surpreendentemente positivo comparado com outros momentos. Por mais que as pessoas discordem veementemente sobre a legitimidade do processo de impeachment, eu acho que ninguém está falando de quartelada, de tanque na rua, não tem nenhuma perspectiva de presos políticos e partidos sendo banidos e Congresso sendo fechado. Acho que historicamente isso no Brasil e na região, na América Latina, é um avanço. Por mais que o momento seja favorável a uma certa depressão, se olharmos por uma perspectiva de longo prazo dá para ser otimista em relação a isso.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Frei Betto

Escritor

“É uma democracia que demonstra maturidade por um lado e é imatura por outro. É uma democracia pouco participativa, é delegativa. Democracia é o povo tendo o poder nas mãos e ainda estamos longe disso.”

O atual estágio da democracia brasileira é contraditório. Primeiro que é uma democracia frágil, recente, pois tivemos 21 anos de ditadura militar. Temos uma muito boa constituição de 1988 porém não suficientemente regulamentada. Por outro lado, todo esse processo de impeachment, o questionamento ao governo, demonstra que nossa democracia de certa forma amadureceu porque há mais transparência nas contas públicas, temos o Ministério Público atuante, prova disso é a Lava Jato. Enfim, é uma democracia que demonstra maturidade por um lado. Por outro lado, é uma democracia imatura porque não passou por uma reforma política, as delações premiadas e os vazamentos têm um caráter visando praticamente um partido político, o partido do governo. Ainda o poder econômico exerce suprema influência nos processos eleitorais apesar de agora estar proibido o financiamento de campanhas políticas por empresas e bancos. Enfim, nós temos uma democracia muito pouco participativa, é uma democracia eletiva, delegativa: delegamos aos políticos nos representar, mas não participamos, não atuamos, não pressionamos. Ou seja, democracia é o povo tendo o poder nas mãos e ainda estamos longe disso.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Ives Gandra Martins

Advogado e professor emérito da Universidade Mackenzie

“Considero o estado da democracia muito bom. Se fosse sistema parlamentar, já teríamos solucionado o problema com o voto de desconfiança. No presidencialista, o caminho é impeachment. Estamos vivendo um processo natural.”

Considero o estado da democracia brasileira muito bom. Nós estamos em um processo de impeachment que é próprio do sistema presidencialista. Se fosse parlamentar há muito tempo já teríamos solucionado o problema com o voto de desconfiança. No sistema presidencialista para afastar governos incompetentes ou corruptos, o caminho é impeachment. Nós estamos vivendo um processo natural. A matéria foi discutida no Congresso, houve manifestações de rua, o povo brasileiro não está concordando com o governo. A presidente tem apenas 10% do apoio da população brasileira, a Petrobras foi destruída pelo governo, o governo criou a mais alta inflação dos últimos tempos, já de dois dígitos, que gerou 10 milhões de desempregados. Destruiu pela corrupção a Petrobras, obstruiu a Justiça em uma tentativa de proteger o presidente Lula, fez pedaladas fiscais que é proibida pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Repetidas pessoas, vinculadas ao governo, senadores, deputados, marqueteiros, tesoureiros de campanha, funcionários indicados pela presidente, estão envolvidos em processo de corrupção, alguns presos outros com indiciamentos, outros com denúncia. O que demonstra que o governo foi um desastre. E para tentar segurar alguma coisa é obrigado a pagar juros de 14,25% ao ano. O Brasil gasta para arrolar a dívida R$ 500 bilhões por ano, só para que os investidores não saíam do país, do sistema financeiro. Evidente que o povo se cansou. O Congresso Nacional a essa altura, com essa onda de corrupção, com todos esses crimes praticados e atos de improbidade administrativa, estão buscando a solução que o sistema democrático permite que é o impeachment, que nos artigos 85 e 86 está. Se fossemos um sistema parlamentar nossa crise já teria se solucionado há muito tempo. Estamos num processo democrático, num contexto difícil, mas o povo tem suportado bem.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Jairo Nicolau

Cientista político e professor na UFRJ

“A democracia brasileira já viveu diversos testes de carga. Mas essa crise é a mais dolorosa, a mais longa, a mais desafiadora que nós estamos passando e ela não acabou ainda.”

A democracia brasileira já viveu diversos testes de carga. Eu acho que os principais foram a vitória do PT em 2002 e antes disso o impedimento do presidente Collor. E nós nos saímos muito bem. Mas essa crise é a mais dolorosa, a mais longa, a mais desafiadora que nós estamos passando e ela não acabou ainda. O eventual impedimento da presidente Dilma ou sua permanência, seja lá qual o resultado, a gente vai viver um dia seguinte doloroso, uma parte da sociedade vai se frustrar, sobretudo se acaso confirmar as expectativas de afastamento da presidente a gente vai entrar num momento de muito debate a respeito da fortaleza, como que uma democracia para todos nós apresentava sinais de maturidade muito grande entrou num processo tão complexo que acabou levando uma presidente eleito a seu afastamento. Acho que a gente vai ficar muito tempo tentando entender como isso se passou, esse processo todo e mensurando a fragilidade das instituições no Brasil. Mas acho que tem uma grande lição positiva disso tudo é que primeiro os militares ficaram de fora e segundo que até agora a taxa de violência política nas ruas, de ações diretas, de conflito armado ou militar estão todas muito fora do horizonte das pessoas. É uma crise institucional dura, desafiadora, mas circunscrita ao mundo do confronto físico legislativo, constitucional, vamos dizer assim.

MOSTRAR ÍNTEGRA

João Pedro Stédile

Líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

“Estamos assistindo na democracia eleitoral formal o verdadeiro golpe. Ou seja, a democracia brasileira sofrerá um duro golpe mesmo nos seus aspectos mais formais que é de respeitar o voto dos 54 milhões de brasileiros que votaram na presidenta Dilma.”

No senso comum, há uma confusão no Brasi. Em geral, se confunde democracia com apenas o direito a votar. Quando na verdade em uma democracia plena é quando todos os cidadãos dessa sociedade tem todos os mesmos direitos de acesso a educação, ao trabalho, a renda, a moradia e aos bens culturais que existem na sociedade. E essa democracia de oportunidades está muito capenga. A sociedade brasileira continua negando esses direitos para a maioria dos seus cidadãos e por isso somos uma das sociedades mais desiguais do mundo. Por outro lado, nessa semana estamos assistindo mesmo na democracia eleitoral formal o verdadeiro golpe, porque as elites do Brasil querem recompor o programa econômico neoliberal para sair da sua crise econômica precisam afastar a presidenta Dilma mesmo que não haja crime nenhum para isso. Então se articulou no parlamento um verdadeiro centrão dos parlamentares que a maioria deles foram financiados por essas elites financeiras e virou um golpe que levaria a deposição da presidenta Dilma e a ascensão do vice Temer e Cunha que são réus em casos muito piores. Eu acho que a democracia brasileira sofrerá um duro golpe mesmo nos seus aspectos mais formais que é de respeitar o voto dos 54 milhões de brasileiros que votaram na presidenta Dilma.

MOSTRAR ÍNTEGRA

José Murilo de Carvalho

Historiador e cientista político

“Democracia hoje tornou-se um termo equívoco, no mínimo ambíguo. Se a entendermos como preservação dos três poderes e de suas funções de representação, de governo e de judicatura, diria que a democracia brasileira claudica, mas não corre perigo.”

Democracia hoje tornou-se um termo equívoco, no mínimo ambíguo. Se a entendermos como preservação dos três poderes e de suas funções de representação, de governo e de judicatura, diria que a democracia brasileira claudica, mas não corre perigo. Claudica porque é grande a insatisfação com o desempenho do Executivo e do Legislativo e com o mundo político em geral. Não corre perigo imediato porque não há ameaças internas (militares) e externas como em 1964. Um eventual impeachment, no entanto, litigioso como está sendo, enviará sinais negativos. Temos muito caminho pela frente.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Maílson da Nóbrega

Economista, ex-ministro da Fazenda

“A democracia brasileira está consolidada. As investigações em curso sob a Operação Lava Jato, a imprensa livre, a liberdade de expressão e o funcionamento dos mercados são demonstrações inequívocas dessa nova realidade.”

A democracia brasileira está consolidada. As investigações em curso sob a Operação Lava Jato, a imprensa livre, a liberdade de expressão e o funcionamento dos mercados são demonstrações inequívocas dessa nova realidade. O processo de impeachment sob exame do Congresso ocorre normalmente, não se configurando a hipótese de golpe ou ameaça à democracia como tentam fazer crer o governo, o PT e seus simpatizantes. A democracia brasileira passa em dois testes conhecidos que afirmam sua consolidação. O primeiro criado pelo professor Samuel Huntington, da Universidade de Harvard, diz que uma democracia está consolidada se for capaz de realizar duas eleições gerais consecutivas sem a contestação de seus resultados. Já realizamos sete eleições gerais limpas, ausentes de fraudes. O segundo teste constante da literatura de ciência política diz que uma democracia está consolidada quando seus resultados são imprevisíveis. Isso acontece no Brasil. Para comparar, veja o caso da Rússia, se Putin se candidatasse a qualquer cargo, é certo que será eleito. Em resumo, em meio à essa crise fica demonstrada a consolidação da democracia brasileira. Ela está saudável, sem riscos.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Mansueto Almeida

Economista

“A democracia brasileira não está em crise. Ao contrário, o que nós observamos nos últimos foi que apesar de crises econômica e política muito sérias, as instituições funcionaram.”

A democracia brasileira não está em crise. Ao contrário, o que nós observamos nos últimos foi que apesar de crises econômica e política muito sérias, as instituições funcionaram. O Tribunal de Contas da União funcionou, o Supremo Tribunal Federal funcionou, Ministério Público, Justiça Federal. Então eu acho que não há nenhum receio de crise na democracia, que a democracia está se enfraquecendo. Ao contrário, apesar de a democracia brasileira de ser muito jovem tem mostrado um progresso muito grande. As instituições brasileiras nos últimos 20 anos melhoraram bastante. No meu ponto de vista, de economista, comparando o Brasil com vários outros países emergentes, como China, Rússia, Índia, de longe o Brasil é o país com instituições muito mais fortes. Você tem uma justiça que é independente, você tem órgãos de controle com pessoas muito competentes que estão mostrando que estão funcionando. E além disso tudo, novamente, apesar de a crise ser econômica e política, você não tem risco institucional. Todo esse processo de impeachment que a gente está assistindo no período recente está sendo todo feito dentro das regras democráticos e do que manda a Constituição. Então eu não tenho medo em relação à democracia brasileira. Eu acho que essa democracia jovem está se consolidando e melhorando.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Maria Hermínia Tavares

Cientista política e socióloga

“A democracia não está ameaçada. Existe uma crise política no país que é de governo e talvez dos sistemas de partidos, mas não do sistema democrático.”

Eu acho que a democracia no Brasil não está ameaçada e não está em crise. Existe uma crise política no país que é uma crise de governo, e talvez dos sistemas de partidos mas não do sistema democrático. As instituições estão submetidas a um teste de estresse muito forte e têm funcionado sem problemas. Esse processo todo de contestação do governo Dilma tem passado pelas instâncias por onde tem que passar, pelo Congresso, pelos partidos, pelo sistema Judiciário e até agora tem passado bem. A crise é séria, mas eu creio que as instituições estão respondendo e estão de alguma maneira contendo o conflito dentro de limites que são aceitáveis.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Monica de Bolle

Economista pesquisadora do Peterson Institute for International Economics

“A democracia está passando por uma fase de transição, de maturidade, que é turbulenta, cheio de tensões. Mas quando o Brasil sair desse momento turbulento sai com uma democracia mais fortalecida.”

Ao meu ver a democracia está passando por uma fase de transição, de maturidade. A gente quando passa pela infância, adolescência, as nossas fases de crescimento e de transição sempre são marcadas por alguma turbulência. Isso não é diferente para democracias e sistemas democráticos. Acho que é mais ou menos a mesma coisa. O que a gente vive no Brasil hoje é de fato esse momento de transição, que é turbulento, é cheio de tensões, contradições, um pouco essa coisa da divergência do que se passa no país hoje. Mas isso tem se traduzido no Brasil de forma positiva. Para mim, eu estando de fora, não tão presente no Brasil e tendo a capacidade de ter certo distanciamento por não estar vivendo essas tensões no dia a dia, a sensação que me dá é que apesar de tudo, de pessoas terem opiniões completamente diferente das nossas, e causarem estranhamento que até dividem as pessoas em grupo, eu acho que o fato de haver uma discussão aberta, de as pessoas poderem manifestar suas opiniões, de termos isso às claras, sem que as pessoas estejam sendo manipuladas de alguma maneira. Eu não acredito num mundo como o de hoje na história de que a mídia tem tanta capacidade de influência sobre as pessoas, acho que as pessoas têm acesso a informação se informam e formam suas próprias conclusões. Acho que o estágio da democracia é esse: vivemos um momento de transição. Acho, pegando um aspecto mais otimista, que quando o Brasil sair desse momento turbulento sai desse momento com uma democracia mais fortalecida por mais que exista hoje um discurso de golpe que tem gente que acredita que isso esteja acontecendo no Brasil, acho que com o tempo isso vai se desvanecer porque não é isso. Tudo o que está acontecendo está acontecendo dentro da nossa Constituição no regime que a gente concordou em 1988 quando na transição para o regime democrático que hoje temos no país. A minha resposta fundamental é essa: é uma momento de transição, como todos é turbulento, mas a democracia brasileira tem tudo não só para sair disso, como para sair disso muito fortalecida.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Oscar Vilhena Vieira

Professor de direito constitucional e fundador da Conectas Direitos Humanos

“Há uma preocupação que é a qualidade dos membros do parlamento, em especial do presidente da Câmara. Feita essa ressalva, é admirável o que está acontecendo no Brasil neste momento.”

Evidente que nós estamos passando por um momento absolutamente turbulento. O que eu destaco é a solidez de algumas das nossas instituições. Eu não veria esse cenário que estamos passando no Brasil em qualquer outro país emergente, em qualquer outro país em desenvolvimento. Você tem a liberdade de imprensa, você tem as manifestações na rua sendo realizadas de maneira absolutamente pacífica, você tem um processo que corre com monitoramento muito próximo do Supremo Tribunal Federal. Então muito embora seja um momento de crise do governo, crise política, é surpreendente o fato de que essa crise está sendo tratada de uma maneira razoavelmente procedimentalizada pelas instituições. Isso é um bom sinal. Dito isso, há evidentemente uma preocupação que é a qualidade dos membros do parlamento, em especial do presidente da Câmara dos Deputados, que é um elemento desestabilizador dessas práticas institucionais. Feita essa ressalva, é admirável o que está acontecendo no Brasil neste momento.

MOSTRAR ÍNTEGRA

Pablo Ortellado

Filósofo e professor de Gestão de Políticas Públicas da USP

“O desafio da democracia brasileira é como ela vai lidar com essas contestações à esquerda e à direita ao sistema de representação, a essa sociedade civil vibrante e atuante que não está vinculada a partidos políticos

Desde anos 1970, as democracias liberais estão passando por uma crise estrutural de legitimidade do sistema de representação e o Brasil em certo sentido desviou dessa rota quando no processo de redemocratização ele soube introduzir um novo ator dentro desse sistema, um ator que misturava partido político e movimento social de maneira que você não podia distinguir o que é o que. E por meio desse expediente, a criação de um partido-movimento que foi o Partido dos Trabalhadores, se contornou aquela crise que estava afetando diversas democracias durantes os anos 70, início dos anos 80. É esse arranjo de um partido-movimento que extrai sua legitimidade dessa conexão profunda com a sociedade civil, que foi colocado em questão em junho de 2013, quando nós tivemos novos atores da sociedade civil que rejeitavam aquele modelo de indistinção entre partido e movimento. Houve contestações à esquerda (Movimento Passe Livre, movimentos contra a Copa ou movimentos secundaristas) e mais recentemente contestações à direita. O desafio da democracia brasileira é como é que ela vai lidar com essas contestações à esquerda e à direita ao sistema de representação, a essa sociedade civil vibrante e atuante que não está vinculada a partidos políticos. Se ela vai tentar incorporar, cooptar, capturar essas novas formas ou se ela vai agir da mesma forma ou de maneira diferente quando elas acontecem à esquerda ou à direita. A melhor saída, a meu ver, seria um sistema de representação que fosse sensível e escutasse essas reivindicações autônomas da sociedade civil e que respeitasse a sua autonomia sem tentar incorporá-las com a finalidade de renovar e injetar, mais uma vez, legitimidade para o sistema de representação esvaziando a sociedade civil da sua vitalidade que é necessária para o fortalecimento democrático.

MOSTRAR ÍNTEGRA